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3.3.06

65 Faixas.... "swing '42" -- DJANGO REINHARDT-- Djangolodgy (1936-1948)

Por partes: Django Reinhardt, cigano nascido na Bélgica em 1910, aprendeu a tocar guitarra em caravanas, escapou à perseguição racial movida pelos nazis durante a segunda guerra mundial, refugiou-se em Londres, mudou-se para Paris, fundou com o efusivo violinista Stephane Grapelly o Quinteto de Jazz do Hot Club de França, gravou muito material, salvou a família de um incêndio, pagou a ousadia com um ano de convalescença e outros danos físicos, voltou a gravar muito material (desta vez com a mão esquerda severamente danificada), apaixonou-se pela guitarra eléctrica, andou em digressão pelos Estados Unidos com a big band de Duke Ellington, tinha o segundo bigode mais sinistro do século XX e o melhor par de dedos que a Europa do jazz alguma vez se orgulhou de ouvir. Sem querer enunciar minuciosamente todas as particularidades do percurso de vida (e que percurso!) deste guitarrista – e, já agora, desrespeitando clamorosamente a cronologia dos eventos – parece por demais evidente que não havia muito mais para acontecer a este homem humilde de humor imprevisível e modos sinuosos.
Estas vivências – e aqui a palavra vivência recupera enfaticamente o seu significado etimológico – transparecem e reflectem-se no legado musical de Django. Aliás, o melhor elogio que se pode fazer à música de Django é que esta não andará muito longe de ser um postal animado da vida do guitarrista e do mundo em que vivia, através dos seus olhos e, sobretudo, da sua imaginação. É bem verdade que esta é uma visão romântica da coisa Django, mas é preciso não esquecer que Paris é a cidade de Django por excelência, e que em Saint Germain des Prés o romantismo se impõe sem ser uma imposição. A música de Django chega a ser coisa só por si por vias de ser intemporal – não tem par no passado, e muito menos no presente, apesar do surto de guitarristas apre-que-toca-tal-e-qual-o-django-tocava que enchem o metro de Nova Iorque – improvável – quem diria que um cigano nascido na Bélgica acabaria por ser adoptado pela boémia parisiense por swingar música negra importada do continente americano? – e absolutamente inédita – Django é a legitimação do swing, Jazz que não empina nariz, justo logótipo de um groove que escravizou e continua a escravizar o mundo.

A faixa que a partir de hoje fica disponível para download no nem1nome, swing 42, não tem nada de obscuro. Pelo contrário! Esta foi uma das músicas mais rodadas nas telefonias dos parisienses durante a Segunda Grande Guerra. Suponho que os acordes maiores e o ritmo festivo desta faixa funcionassem como interlúdio de excelência para os blocos noticiosos que davam conta dos avanços e recuos das tropas aliadas nas frentes de batalha. É notável como uma composição instrumental que narra tão bem as suas origens consegue ser tão actual e permanecer sugestionável após tanto tempo.

Compreende-se perfeitamente que algum artwork dos trabalhos que Django gravou contenha alusões a um certo imaginário da Paris enevoada que o albergou – reconheça-se mérito a Sylvian Chomet por captar isso na perfeição nas suas Triplettes de Belleville, filme de animação de 2003 em que Django tem direito a um curto mas adorável cameo – mas dou-me por satisfeito por saber que, com um bocadinho de imaginação, se poderiam arranjar milhentos outros temas para ilustrar graficamente o maravilhoso caleidoscópio musical que é a música deste vulto. Para mim, tudo isto continua a parecer um valente estalo a que alma, sem sombra de masoquismo, se submete. Trechos de um filme trémulo de compasso descontraído, em tons sépia, que se acaba por revelar minuciosamente realizado e grande demais para o espectro visível. Tudo isto e muito mais continua a soar a pouco… Alguém disse liberdade. Eu não digo nada.


DJANGO REINHARDT "SWING '42"


[aviso] o blog nem1nome vai conhecer, durante o mês de Março, nova (e curiosamente ansiada!) interrupção. O tasco encerra para o taberneiro ir dar uma volta pelas Américas do Sul - Obrigado a todos os que por aqui têm passado, espero sinceramente voltar com uma mão cheia de músicas e de histórias para partilhar convosco. E agora digo, com toda a propriedade… Hasta![/aviso]